Eu chorei. Chorei e entrei na partolândia. Antes de ir eu senti medo de ter quebrado o ritmo doce com que a Catarina tinha me guiado até ali. Pensei que tinha me precipitado aceitando romper a bolsa, me entreguei e senti raiva do cardiotoco, muita muita raiva mesmo, fiquei com vontade de arrancar aquelas faixas.
Relato de segundo parto natural hospitalar, com diabetes gestacional
Ao contrário do parto do meu primeiro filho, onde tudo aconteceu em 12 horas, com fases e sinais claros, Catarina foi chegando sutilmente, como quem está curtindo e mostrando o caminho. Ela me fez “abrir a janelinha” e observar a paisagem.
Tudo começou com 36 semanas e 2 dias. A partir desse dia passaríamos a ter consulta e exames semanais para acompanhar mais de perto, já que a diabetes não estava 100% controlada. Nos 16 dias seguintes (até 38 semanas e 4 dias), foram algumas idas e vindas entre exames e consultas. Com 37 semanas tivemos um “alarme falso”, eu senti dor nas costas junto com as contrações justamente quando estava indo pra uma consulta. Nesse dia descobrimos que meu colo já estava afinando e tinha quase 2 cm de dilatação. Como não evoluiu, iniciamos com induções naturais, porque eu não poderia passar de 39 semanas (por causa da diabetes).
Fiz acupuntura, escalda pés, homeopatia e quase tudo que estava na lista de induções naturais, tudo acompanhado, é claro. Mesmo assim as contrações não engrenaram. Nas consultas seguintes o colo foi evoluindo, a dilatação foi aumentando e eu sempre voltava pra casa, porque não estava em trabalho de parto. Que privilégio! Nessa hora eu já estava super agradecida à minha equipe, eu sei que no sistema normal teriam me internado nos primeiros centímetros de dilatação, mesmo eu não estando em TP, provavelmente eu iria pra uma cesárea por não evoluir!
Bom, no dia 03/06 eu senti dores diferentes, ainda leves, mas eram diferentes, cólica, contração, dor nas costas… mas nada de ritmo. Fomos pra SP, a Márcia me examinou e huhuuuu! Estava com 6cm de dilatação! Nesse dia a recomendação foi ir passear no shopping perto do hospital e ir pra maternidade à noite ou imediatamente se a bolsa rompesse. Que alegria!
Ah! O passeio no shopping foi porque eu moro longe do hospital (mais de 85km) e por isso também tinha a preocupação de eu entrar em TP dentro do carro!
Bom, fui passear com meu marido e minha doula. Foi uma tarde muito gostosa. Era o dia que virava a Lua nova, a 9° lua da Catarina. Coincidência ou não, a contagem de luas deu certo nos meus 2 filhos.
No fim da tarde voltei na Casa Moara, a Márcia me examinou novamente, e dessa vez corremos pro hospital! O colo evoluiu mais, o parto parecia eminente, só faltava ritmo nas contrações ou a bolsa romper. Tudo indicava que seria rápido! Que momento!
Entramos no quarto da maternidade às 18h18 do dia 03. Lembro das horas iguais, lembro de estar sentindo um pouco mais as dores, o meu marido estava empolgado e distraído explicando pra Fabi (doula) como se joga RPG, eu estava começando a mudar nas contrações, em algumas eu já tinha que parar e me concentrar, mas principalmente estava com sentimento de alívio por estar onde queria estar.
Demos entrada e fui pro cardiotoco. Nada de consistência no ritmo das contrações… Será que eu nem estava em trabalho de parto ainda? O cardiotoco quase não marcou contração. Rolou um balde de água fria. A Dra. Andrea e a Márcia foram embora porque chegariam rápido caso eu sentisse algo diferente. A orientação era descansar. A Fabi ficou com a gente, ouvimos música, demos risada, caminhei e descansamos…
Passei a madrugada na mesma. Um pouco de dor a mais, mas nada de ritmo. Eu dormi bem, até. Umas 3h da manhã levantei e comecei a me mover. Queria engatar aquilo de alguma forma, fiquei repassando mentalmente meu primeiro parto. Eu não tive ritmo também, mas tive a bolsa rota pra deixar claro que era a hora de ficar atenta. Dessa vez sem bolsa, sem ritmo, sem eu esboçar muita dor, não parecia um trabalho de parto realmente… Aceitei que eu não era um relógio, voltei pra cama, tentei desencanar e dormi de novo.
Bom, às 5h40 a enfermeira do hospital pediu mais um cardiotoco, fiquei lá mais 15min, pra marcar o que eu já sabia, as contrações estavam irregulares. Eu mandei a foto do resultado pra Dra. Andrea e ela achou que era o momento de vir.
Às 6h30 já estavam todos lá. Cardiotoco de novo, tentaram posicionar diferente para ver se registrava. Era muita atenção em torno daquele aparelho. Eu já estava me concentrando na respiração quando a contração chegava, mas nos intervalos eu conversava normalmente… Estava curtindo e achando que ia ter muito tempo ainda. Das 7h até umas 9h30 eu fiquei na cama, meu marido ficou aquecendo meus pés, a doula me fez massagem, acupuntura, eu comi, ouvi minhas músicas… Não percebi que já estava enrolando na porta da partolândia.
Perto das 10h a Dra. me examinou, disse que a bebê estava ali, rompendo a bolsa, e que ela nasceria imediatamente. Ela me deu essa escolha, eu pensei rápido e disse que sim, que poderia romper a bolsa. Ela rompeu, senti uma contração na hora, achei que ia levantar pra finalmente ir pra água e surpresa! Depois de romper a bolsa precisa ficar mais 10 minutos no cardiotoco!
Eu chorei. Chorei e entrei na partolândia. Antes de ir eu senti medo de ter quebrado o ritmo doce com que a Catarina tinha me guiado até ali. Pensei que tinha me precipitado aceitando romper a bolsa, me entreguei e senti raiva do cardiotoco, muita muita raiva mesmo, fiquei com vontade de arrancar aquelas faixas.
A partir daí não lembro muito dos detalhes, lembro das sensações de fúria e urgência, de começar a sentir vontade de fazer força, da Fabi tentando esfriar a água da piscina que acabei entrando mesmo achando um pouco quente ainda. Assim que eu entrei na água a Márcia me tocou e pediu pra eu sair, estava nascendo e não podia nascer na água.
As pessoas voltaram para a sala. Eu não vi mais nada. Me abaixei agarrada nos joelhos do meu marido e senti os puxos, a força do corpo se desmontando sozinho, a força dos meus joelhos no chão, a força da minha barriga tremendo, lembrei da terra, do ar, da água, senti o círculo de fogo. Foi muito rápido! Pedi para sentar no banquinho, que estava atrás de mim, meu marido ficou na minha frente e se preparou pra pegar a Catarina. Ele a viu chegar no mundo!
Eu abri um pouco os olhos e vi a cara dele maravilhado. Fechei os olhos, e me escutei maravilhada. Mais uma força e ela nasceu. Meu marido quase a pegou pra me passar, mas paralisou por um segundo. Então ela veio direto pra mim. Tudo passou, voltei para a Terra, ninguém a tocou, aquela cabeludinha cheia de vernix era toda minha.
Eu não acreditava que tinha acabado. Ela não chorou, demorou para perceber que tinha nascido. Ficou no meu peito, abriu os olhinhos e assim ficamos, fomos para a cama, ela mamou, eu senti o cordão pulsar e parar de pulsar, meu marido cortou o cordão, ele viu a placenta sair, e eu estava encantada com a Catarina no peito. O tempo parou. E foi assim.
Meu parto acabou, tive menos de 1h de dor dor real mesmo. Foi rápido, tranquilo, períneo integro. Fui respeitada, cuidada, a única intervenção no processo foi o rompimento da bolsa que eu sei que foi uma intervenção benéfica e na hora certa. Ter ficado muito tempo no cardiotoco me deixou frustrada no começo, mas em poucos dias essa frustração passou, eu precisava de mais monitoração, meu parto não era tão baixo risco assim, então faz parte. Hoje estou apaixonada por nossa primeira história!
Para finalizar, fiquei pensando, quantas mulheres não engatam ritmo nas contrações e vão para a cesárea? Quantas mulheres demoram algumas horas pra dilatar e acabam na cesárea? Quantas mulheres não têm o privilégio que eu tive de esperar semanas em casa e mais de 12 horas de internação antes de tudo começar? Quantas mulheres seriam internadas lá naqueles primeiros centímetros de dilatação e mais tarde seriam levadas a acreditar que não eram capazes de parir?
Esse parto tão diferente do primeiro porque me mostrou o quanto não sei de nada. Me deixou curiosidades e muita coisa para elaborar. Foi um parto rico. Um presente que vou desembrulhar com carinho.
À minha equipe, só tenho amor, eu só consegui porque tive a bênção de ter ao meu lado pessoas que não duvidaram nenhum minuto que eu ia parir. Dessa vez eu tive tempo de me conectar com cada uma e entender os papéis, que sorte a minha!
Obstetra: Dra Andrea ( @andreasqc )
Parteira: Marcia ( @marciamdk )
Pediatra: Dra Ana paula ( @ana.paula_martins )
Doula: Fabiana ( @fabiananobregaterapias )
Muito obrigada