Ilustração: Marcella Briotto

A hora dourada, também conhecida como “golden hour”, corresponde à primeira hora de vida do bebê e, como o próprio nome diz, é muito valiosa para a saúde e bem estar da mãe e do recém-nascido.

Imagine sair de um lugar protegido, com regulação da temperatura, da iluminação e dos estímulos sonoros e com oferta constante de nutrientes, e se deparar com um ambiente com temperatura mais baixa, sob luz intensa e cheio de estímulos desconhecidos? A transição do ambiente intrauterino para a vida extrauterina não é uma tarefa simples, mas é possível adotar algumas medidas para que essa passagem seja feita de forma gentil e suave.

Nos primeiros 60 minutos após o nascimento, tanto a mãe quanto o bebê costumam estar mais alertas e atentos, por isso é tão importante aproveitar esse período para promover o vínculo entre a mãe e a criança. A seguir, apresentamos algumas recomendações feitas por órgãos como o Ministério da Saúde e a Organização Mundial da Saúde para a “hora dourada”.

Hora dourada no aconchego da mãe

Após o nascimento de um bebê saudável, o melhor lugar para ele estar é no aconchego do colo da mãe (desde que esse seja o desejo dela, é claro). O recém-nascido deve ser colocado de bruços e sem roupa, diretamente no abdome ou ventre materno, apenas com o dorso coberto. Esse contato pele a pele na primeira hora de vida é precioso e ajuda o recém nascido a regular a temperatura corporal e manter-se aquecido, fortalece o sistema imune por meio do contato com a microbiota materna, além de favorecer a construção do vínculo mãe-bebê, por meio do cheiro, toque e contato visual.

Independentemente da via de parto (parto vaginal ou cesárea), o contato pele a pele deve ser priorizado, e a avaliação inicial do recém-nascido pode ser realizada no ventre materno. Procedimentos de rotina (como pesagem, vacinas, entre outros) podem ser realizados após essa primeira hora.

Também é importante cuidar do ambiente em que o recém nascido vem ao mundo, para que essa chegada possa ser suave e confortável. Algumas práticas possíveis são: diminuir a luz ambiente, evitando o uso de lâmpadas muito claras (como é comum nos ambientes hospitalares); diminuir o barulho no local do parto, construindo um ambiente calmo; e assegurar que a temperatura da sala não esteja muito baixa.

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Foto: Kátia Ribeiro

Amamentação na hora dourada

O contato pele a pele também permite que a amamentação possa ser estimulada na primeira hora de vida, o que é benéfico tanto para a saúde materna quanto do bebê.

Por um lado, a sucção da criança no seio materno faz com que o organismo materno libere ocitocina, um hormônio que auxilia na contração do útero, o que ajuda na expulsão da placenta de forma fisiológica, além de diminuir a perda sanguínea no pós-parto, protegendo a mãe de uma hemorragia uterina – uma das principais causas de mortalidade materna.

Para o bebê, a amamentação na primeira hora permite que ele se alimente do colostro, um líquido de cor amarelada que desce antes do leite materno, e é rico em anticorpos e nutrientes – tanto é que é considerado por muitos como a “primeira vacina” do bebê. Caso o bebê não mame neste momento, não se preocupe: os recém-nascidos possuem uma reserva energética que os protege durante as primeiras horas de vida. Lembre-se de não oferecer fórmulas e bicos artificiais sem indicação clínica, pois eles dificultam o estabelecimento da amamentação de forma eficaz.

Além disso, nessa fase o reflexo de sucção do bebê está mais ativo, e esse estímulo favorece a descida do leite, contribuindo para uma experiência de amamentação mais satisfatória. Pesquisas apontam que o ato de amamentar o bebê na primeira hora de vida aumenta significativamente as chances da amamentação prosseguir até os seis meses de vida, além de diminuir os índices de mortalidade infantil.

A exceção para esta recomendação aplica-se às mães com HIV/HTLV positivo. Nesses casos, o Ministério da Saúde contraindica a amamentação.

Quando cortar o cordão umbilical

É pelo cordão umbilical que acontecem as trocas entre a mãe e o bebê durante a gestação. O cordão é formado por duas artérias e uma veia, e é revestido pela geleia de Wharton, substância mucosa e espessa que protege seus vasos. Pelo cordão, o feto recebe oxigênio e nutrientes para se desenvolver de forma saudável. Após o nascimento, o fluxo sanguíneo da placenta para o bebê continua ativo durante alguns minutos, até que sua pulsação cessa.

Então, qual seria o momento ideal para realizar o clampeamento, ou seja, a secção do cordão? Evidências recentes recomendam que o clampeamento seja realizado após 1 a 3 minutos do nascimento, ou até que a pulsação do cordão tenha cessado. Isso porque o volume adicional de sangue circulante entre a placenta e o bebê – que pode variar entre 30 e 150 ml – aumenta a reserva de ferro por até 6 meses após o nascimento, diminuindo a incidência de anemia no recém-nascido.

Agora que você já sabe todos os benefícios da “hora dourada”, que tal conversar sobre isso com a equipe que te acompanha e expressar seus desejos no plano de parto?

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Foto: Kátia Ribeiro

Fontes

PORTARIA Nº 371, DE 7 DE MAIO DE 2014 – Ministério da Saúde

Sociedade Brasileira de Pediatria: Documento Científico: Nascimento Seguro – 2018

WHO Intrapartum care for a positive childbirth experience – 2018

WHO. Guideline: delayed umbilical cord clamping for improved maternal and infant health and nutrition Outcomes. 2014

Livro: Nascer Sorrindo, de Frederick Leboyer – 1974

Médica e obstetra de Parto Humanizado